segunda-feira, 3 de outubro de 2016

NOTAS SOBRE O GOLPE E O MAR DE CONSERVADORISMO

"O verdadeiro problema é que o PMDB não tem estrutura ideológica ou política que possa formular e implementar uma agenda política nacional coerente. Apesar da ilustre história do partido cuja força motriz levou o Brasil da ditadura militar para a democracia, o PMDB, que agora detém o equilíbrio do poder político, foi transformado numa coalizão de oportunistas “caciques” regionais que em sua maior parte - e não são exceções - buscam o poder político para o seu próprio bem. Um partido tal não é adequado para a tarefa de fornecer uma orientação política." - apontamentos da Embaixada Norte-Americana, extraídos de documentos vazados pelo WikiLeaks, numa reunião em 2006 na qual Michel Temer era informante dos norte-americanos. (https://wikileaks.org/plusd/cables/06SAOPAULO30_a.html…)
Lembrando que a embaixadora dos EUA no Brasil desde agosto de 2013, Liliana Ayalde, serviu como embaixadora no Paraguai de 2008 a 2011 e transferiu seu cargo para James Thessin meses antes do golpe que destituiu o presidente Fernando Lugo em 22 de junho de 2012.
Nada de novo quando se fala do país que, comprovadamente, teve participação no golpe de 64 no Brasil, como fartamente documentado e exposto no documentário O Dia que Durou 21 Anos.
O que nos traz ao atual interesse americano em terras tupiniquins: implantação do neoliberalismo (ou venda do estado ao capital privado).
A agenda neoliberal (privatizações, desregulamentações e cortes em programas sociais) criada nos porões de Chicago sempre precisa do caos político-econômico para ser instaurada. Foi assim no golpe de Pinochet no Chile, foi assim na década de 90 na América Latina e está sendo assim no golpe de estado em curso no Brasil.
E quem poderá ser o veículo nacional de implantação da agenda? Bem, os Estados Unidos, declaradamente, não confiam muito nos caciques do PMDB. Lembremos então de quem arcou com os R$ 45 mil pagos pela peça de acusação do golpe como registrado em vídeo e de quem insistiu na tese de “conjunto da obra” durante a encenação do processo.
Além disso, Gilmar Mendes disse recentemente que ‘’está ficando cada vez mais difícil’’ votar os quatro procedimentos da ação que o PSDB move contra a chapa Dilma-Temer até o fim de 2016. O que faria com que, durante dois anos, Temer pudesse ser cassado e uma eleição indireta viria logo em sequência.
Enquanto isso, a junta de golpe que assaltou o poder executivo nacional decretou aumento de 50% nos gastos em publicidade estatal. Mais 24,4% na Globo, mais 78% na Folha/UOL, mais 624% na Abril e mais 1129% na Band. Eles querem com recibo e juros.
Assim sendo, com a mídia vendida e fortalecida, e as esquerdas à míngua, as eleições presidenciais antecipadas com aval popular não seriam uma ótima maneira de legitimar o golpe?
O empenho na luta e o crescimento das mobilizações quando do aparecimento da pauta “Diretas Já” demonstra que não foi só a direita que não aceitou os resultados das urnas em 2014.
Entre os devaneios do ''Diretas Já'' e ''Anula, STF'', fico com o segundo. Somente ele conservaria o quase nada que resta de democracia. Afinal, antecipar eleições por meio de golpe parlamentar é golpe.
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O conservadorismo está em franca expansão no Brasil.
A vereadora mais votada do Recife critica mulheres que deixam de ser submissas aos seus maridos: ''o homem está, sim, acima da mulher".
Um pastor da Igreja Universal foi o vereador mais votado de Manaus e Carlos Bolsonaro foi o mais votado no Rio de Janeiro.
Na Bahia, um pastor sargento, durante os debates para a eleição à prefeitura, sacou uma bíblia para fazer a réplica à uma candidata do PCdoB.
Citado pelo vice-presidente do próprio PSDB como "uma farsa em todos os sentidos" e "totalmente desprovido de escrúpulos", o novo prefeito de São Paulo apontou: “namorado educado não divide conta com namorada. E muito menos deixa ela pagar. Se não tiver dinheiro, faça um programa mais simples”.
Se o voto anulado por togados e parlamentares representa a falência democrática, o voto anulado voluntariamente é um insulto à memória daqueles que lutaram contra a ditadura e pelo direito de votar.
Com a esquerda representando, historicamente, minorias políticas e grupos de resistência, o desencanto popular com a política sempre vai fortalecer a direita conservadora. Vender soluções é sua especialidade.
Não há como, de fato, se abster na democracia representativa – ao não escolher um lado, você está escolhendo o lado do oportunismo imediato. E, desse oportunismo, o conservadorismo sabe se aproveitar como ninguém.
 
 

sexta-feira, 22 de julho de 2016

MOVIMENTO DA GENTE

De um lado, uns vivem costumeiramente a luta da vida.
De outro, golpistas estraçalham os direitos sociais e trabalhistas, dificultando a luta pela vida.
A herança da distribuição de terras nacionais ainda grita. Oligarquias regionais, senhores de terra e famílias abastadas se espalham pelas dimensões continentais de nosso país, usando mão-de-obra escrava, legislando sobre seu território e mantendo um país de muitos nas mãos de muito poucos. Desde as Capitanias Hereditárias.
Algumas terras resultaram em campos de trabalho nazistas, com a escravização de jovens negros a serviço da casa-grande, sempre com seus senhores aliados à direita ou à extrema-direita fascista, como o Movimento Integralista. Hoje, os filhos destes senhores continuam a ordenar, enquanto os filhos dos negros povoam outros campos de trabalho escravo ou as favelas das regiões urbanas.
Que a luta no campo não saia mais das cidades, pois nelas se assentam muitos dos filhos da desigualdade social. Há que se fazer da (T)terra um lugar menos injusto.
Em momento de situação tão frágil e instável na política nacional, é fundamental olhar nos olhos daqueles que costuram o maior movimento social do mundo e poder, enfim, ler o sentido da vida: a luta política.

quarta-feira, 25 de maio de 2016

ANATOMIA DE UM GOLPE

O golpe de estado, que já estava escancarado, está agora comprovado.

Dessa vez, ao menos, não teremos que esperar anos para entender as relações entre golpistas.

Conforme foi exaustivamente apontado ao longo dos últimos meses, está provada a participação da ‘grande’ mídia, do STF, do Senado, do Parlamento e do exército.

A contar a participação de cada setor dentro dos limites nacionais, o processo pode ser denominado Golpe de Estado Midiático-Judicial.

Ficou comprovada também a não representatividade do parlamento em relação ao povo (“O que que a gente fez junto, Romero, naquela eleição, para eleger os deputados, para ele ser presidente da Câmara?”).

Enquanto isso, a Folha vai fazendo vazamentos seletivos, entregando os bastidores do golpe que lhe convém.

Nos vazamentos, fica claro como pretendiam usar o poder conciliador de Lula para acalmar os setores golpistas. Porém, concluem, a partir da polarização instalada pela mídia golpista, que a nomeação serviria somente para chamar os movimentos sociais para a briga contra o golpe e não para acalmar o mercado - leia-se, o grande capital. (“Não adianta esse projeto de mandar o Lula para cá ser ministro, para tocar um gabinete, isso termina por jogar no chão a expectativa da economia. Porque se o Lula entrar, ele vai falar para a CUT, para o MST, é só quem ouve ele mais, quem dá algum crédito, o resto ninguém dá mais credito a ele para porra nenhuma. Concorda comigo? O Lula vai reunir ali com os setores empresariais?”)

Já nos recentes vazamentos dos Wikileaks, ficou demonstrado que Temer atuava como uma espécie de informante de Washington no Brasil e que, além disso, os EUA tinham total noção de que o PMDB não era o partido de confiança que eles precisavam.

Nesse meio tempo, Temer vai revisando a obrigação de participação da Petrobras na exploração do Pré-sal.

Enquanto isso, os EUA vão construir uma base militar na tríplice fronteira (Argentina, Brasil, Paraguai) com o aval de Macri. Segundo Obama, a instalação tem o objetivo de manter a paz e enfrentar os desafios trazidos pelas alterações climáticas.

E aqui, como noticiou a Folha, o Itamaraty, sob a batuta de José Serra, orienta os diplomatas ao redor do mundo a desmontarem a tese de golpe no Brasil. Mesmo depois de comprovada.

Se não são muito inteligentes (espertos sim, inteligentes não), os golpistas ao menos sabem seguir a cartilha de golpe desenvolvida e exaustivamente utilizada há décadas, já que estão fazendo do jeitinho que foi feito no Paraguai, Venezuela, Honduras e Haiti.

Quer dar um golpe em algum lugar? É simples. Em resumo: compre o apoio de meios de comunicação. Compre a cooperação golpista dentro do sistema político. Instaure profunda crise política. Esgote as instituições democráticas. Force a destituição tentando dar um ar de legalidade.

Chegado esse ponto, faça como preferir: coloque militares no poder, entregue o comando a alguma facção armada que você sustenta ou exija eleições gerais e lance seu candidato com todo o apoio financeiro e midiático.

terça-feira, 10 de maio de 2016

À DEFESA DA DEMOCRACIA

Aos alunos e alunas das ocupações de São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Belo Horizonte e de cada canto do Brasil que se levantaram para a defesa de seu direito à educação. Vocês são o futuro.
 
Aos políticos, artistas e opinantes diversos que se postaram em defesa da democracia. Vocês promovem as bases das mudanças que estão por vir.
 
Às instituições e movimentos que entenderam a importância de seu posicionamento, a exemplo da UNE, UBES, Frente Brasil Popular, Brigadas Populares, MST, MTST e todas as outras. À Frente Povo Sem Medo que faz golpista pisar ligeiro.
 
Às mulheres que assistiram à presidenta de seu país ser xingada de todas as formas machistas (in)imagináveis e estiveram ao seu lado na luta por igualdade e respeito. Ficou bem claro qual é o sexo frágil e como ele costuma posar de terno e gravata.
 
Aos professores e professoras da rede pública que, não bastasse terem que lutar diariamente pelas suas condições de trabalho e pelo ensino de qualidade para seus alunos, ainda se mobilizaram e se empenharam para se fazerem ouvidos sobre a História.
 
Aos militantes da velha guarda que, mesmo já não tendo a saúde de outrora ou a esperança juvenil, voltaram às ruas para barrar o assalto ao poder executivo.
 
Aos latino-americanos que saíram em defesa do Brasil. Especialmente, aos milhares de argentinos, colombianos, uruguaios, chilenos e mexicanos que foram às ruas para protestar contra um dos golpes mais escancarados da história da política. Sonho com o dia em que meu povo tenha uma solidariedade política semelhante com nossos vizinhos latino-americanos.

Obrigado.
 
Seguimos juntos, pois, como dizem nossos irmãos latinos: tentaram nos enterrar. Não sabiam que éramos sementes.

segunda-feira, 9 de maio de 2016

ORDEM E CAOS

Após 49 anos, a sessão que afastou Jango da presidência em 1964 foi anulada, em reconhecimento de sua ilegitimidade (adivinhem se na época o processo também tentou soar como "ato jurídico legal").

O processo mais importante que pode existir num sistema democrático é aquele relacionado ao cumprimento ou não do mandato do mais alto cargo executivo, ou seja, um processo de impeachment. Assim sendo, tão importante quanto ser legal, é ser legítimo.

Somente me atendo aos absurdos do processo em curso no Brasil:

- Foi aberto como retaliação ao não apoio do PT à Cunha na comissão de ética;

- Teve a votação conduzida no parlamento por um réu no STF que viria a ser afastado do cargo com um confortável atraso de 18 dias (mesmo os juízes estando com o processo de Cunha na mão desde Dezembro);

- A peça de acusação, base do processo, conforme depoimento em vídeo de Janaína Pascoal, foi paga pelo PSDB -  o mesmo partido cujo integrante foi designado para relator do relatório no Senado. O preço da peça? 45 mil reais.

Nesse meio tempo, o Parlamento se levantou contra o Executivo e o STF assistiu a tudo de braços cruzados e, quando agiu, o fez com uma lentidão constrangedora.

Independentemente do que o Senado disser sobre o processo de impeachment, o presidente da câmara, Waldir Maranhão, acaba de apontar "vícios jurídicos" no rito. Dessa forma, a matéria passa, obrigatoriamente, a fazer parte da alçada do STF, que deve garantir a legitimidade de todo o rito do processo (não foi suficiente a demora de meses no afastamento de Cunha?).

E não há nada de bom sobre Waldir Maranhão. Se ele estiver, direta ou indiretamente, envolvido na escalada do golpe, nada de inesperado. Se ele realmente estiver ao lado da democracia, que pena de um país que depende da ação desse sujeito para preservar seu estado de direito. Das duas formas, a reforma política dos sistemas eleitoral e representativo brasileiros se mostra emergencial.

Se o que ocorre no Brasil soa como peça de ficção, é porque interesses políticos escusos estão acima das responsabilidades daqueles que deveriam governar para o povo.

As instituições democráticas brasileiras se mostram cada vez mais falidas e sem conseguir exercer seu papel democrático de origem. A resposta para o caos político implantado em 64, a gente bem lembra qual foi.
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Enquanto isso, Dilma sinaliza estar em sintonia com as ruas.

Em seguida a cada grande mobilização popular pela democracia ou a mudanças no processo do golpe, ela dá suas respostas: sancionamento de Lei que eleva imposto de renda sobre ganho de capital relacionado à venda de imóveis; desapropriação de terras para a reforma agrária; regularização de territórios quilombolas; homologação de terras indígenas; criação de cinco universidades federais; aumento de 9% no bolsa-família; construção de 25 mil moradias pelo Minha Casa, Minha Vida; prorrogação do Mais Médicos por três anos; e o desengavetamento de outras políticas sociais.

As frentes populares devem continuar a exercer toda a pressão. Conforme prevê a constituição, é essencial que:

(i) promova-se a auditoria cidadã sobre a dívida externa;

(ii) mude-se o sistema de impostos do Brasil, deslocando o fardo dos impostos sobre o consumo para aquele sobre rendimentos e fortunas;

(iii) garanta-se a soberania econômica nacional por meio dos recursos nacionais estratégicos;

(iv) implemente-se a reforma política nos sistemas eleitoral e representativo, buscando uma maior participação política popular e melhor funcionamento das instituições democráticas;

(v) acabe-se com o oligopólio dos meios de comunicação – informação é poder e este não pode se concentrar nas mãos de meia dúzia de famílias milionárias.

Enquanto as instituições democráticas não funcionarem segundo o nome que ostentam, e estes pontos acima não forem alcançados, as ruas têm que gritar a plenos pulmões.

segunda-feira, 2 de maio de 2016

REDESCOBRIR A ESPERANÇA

“Um cocheiro filósofo costumava dizer que o gosto da carruagem seria diminuto se todos pudessem andar de carruagem”. 
Memórias Póstumas de Brás Cubas

Enfim, teve golpe. Assim acaba o mais duradouro período democrático moderno brasileiro. Minha geração foi recordista.

Meus cumprimentos a todos os envolvidos, direta e indiretamente, no golpe dado no Brasil. Vocês colocaram um sujeito ficha-suja no poder (isto é, se amanhã houvessem eleições, ele não poderia nem se candidatar).

Deputados, senadores, magistrados, "jornalistas", "colunistas", parte da sociedade civil. Vocês conseguiram de maneira notória.

E como eu era inocente. Desde 2011 venho alertando sobre a escalada do golpe, mas, no fundo, nunca achei que realmente era viável concluí-lo no Brasil do século XXI – uma das principais economias globais, o país mais forte do bloco da UNASUL (ou era, ao menos), um exemplo para o mundo em relação a políticas sociais e de combate à fome, como disse a ONU...

Na era da internet, subestimei o poder da mídia oligárquica hegemônica em terras nacionais. Eles souberam usar a internet para dividir e conquistar – mais clássico, impossível. Dividiram a sociedade, dividiram a esquerda, dividiram os progressistas, dividiram os estudantes. Enquanto isso, panfletos políticos semanais, jornais que não deveriam assim serem chamados e as "grandes" emissoras trataram de desmobilizar o povo. Quando as ruas notaram o golpe rasteiro em curso, ele já estava muito bem encaminhado.

Alguns sucumbiram à inocência. Outros à desinformação. Outros ao desânimo. Outros à incoerência. Outros ao ódio de classe. Outros ao macarthismo. Outros à má-fé. Outros à vaidade intelectual.

Num dos movimentos mais sutis e geniais, conseguiram emplacar a impressão de polarização política, fazendo com que muitos não se entregassem a nenhuma causa, achando que, assim, seriam mais justos e razoáveis. Fizeram com que naõ se percebesse que a luta não era esquerda X direita, PT X PSDB-PMDB, democracia X golpe. Era tão somente a velha luta de classes com roupagem de século XXI, ou melhor dizendo,  interesses do povo X a força do capital.

Em tempos de tamanha globalização da informação, a repercussão internacional não permitirá o golpe”, pensava eu. Inocente, mais uma vez. Toda a denúncia feita nos cinco continentes e o apoio recebido dos mais diversos setores da sociedade, desde prêmio Nobel até Pulitzer, não foram suficientes frente à maior força já inventada na história da humanidade: o dinheiro.

Por meio de esquemas de toda sorte, os deputados, os senadores, o STF, a mídia oligárquica, os três poderes, a sociedade civil, foram todos colocados de joelhos. Vocês, golpistas, deixariam Huxley, Bradbury e Orwell boquiabertos.

E, como sempre, o fardo está sobre os mais pobres. Em tempos de crise e instabilidade política, uns deixam de viajar para o exterior, outros deixam de almoçar todo dia. Nas periferias, favelas e morros é onde o golpe dói mais.

Mas talvez, agora, a sociedade brasileira tenha evoluído em alguns aspectos. Talvez tenha sido entendido que a agenda social de um governo que olha também pelos mais necessitados não consegue conviver muito tempo com os detentores do grande capital sem que surjam conflitos de interesse.

Talvez tenha entendido a importância da união latino-americana frente aos interesses do capital. Honduras e Paraguai já haviam alertado o continente sobre os tempos que vivíamos. Não demos ouvidos. Talvez agora as pessoas reconheçam que não se trata de mera casualidade o fato de o governo federal brasileiro ser o terceiro a cair na América Latina num período de menos de 10 anos.

Mas, será que entendemos mesmo? Ou estou sendo inocente mais uma vez?


Como um animal que sabe da floresta, memória
Redescobrir o sal que está na própria pele, macia
Redescobrir o doce no lamber das línguas, macias
Redescobrir o gosto e o sabor da festa, magia

Vai o bicho homem fruto da semente, memória
Renascer da própria força, própria luz e fé, memória
Entender que tudo é nosso, sempre esteve em nós, história
Somos a semente, ato, mente e voz, magia

Não tenha medo, meu menino povo, memória
Tudo principia na própria pessoa, beleza
Vai como a criança que não teme o tempo, mistério
Amor se fazer é tão prazer que é como fosse dor, magia




sexta-feira, 29 de abril de 2016

SER DE ESQUERDA

Ser de esquerda não tem, necessariamente, alguma relação com socialismo, comunismo ou marxismo.

Ser de esquerda é, antes de tudo, ter como norte a melhoria do panorama social da humanidade. É enxergar nas artes, jornalismo, caridade, política, educação, conversas diárias ferramentas de transformação social.

Ser de esquerda é, também, entender que uma sociedade socialmente menos injusta tem que, obrigatoriamente, aderir a valores progressistas. É, portanto, apoiar as diversas causas de minorias políticas, como negros/negras, mulheres e LGBT.

Ser de esquerda é, além disso, tratar da saúde do coletivo da mesma forma que se trata da saúde individual. Entender que, sendo bom para nós, é bom para mim (a inversa não é verdadeira).

Ser de esquerda é votar pensando na melhoria da vida dos mais pobres, além da minha. Defender que a mão do estado seja estendida antes àqueles que precisam mais.

Ser de esquerda é colocar a vida humana acima da saúde do mercado. Sempre optar por enxergar a questão humana envolvida em todas as questões da sociedade, mesmo quando os números parecem prevalecer.

Ser de esquerda é fugir da tendência à transformar vidas humanas em números e lembrar sempre que por trás de cada número de cada estatística há uma pessoa como eu. Dotada de amor, sonhos e sofrimento. De família, carinho e erros.

Ser de esquerda é uma forma de lançar os olhos ao mundo com tolerância, solidariedade e resistência.

Ser de esquerda é querer entregar aos meus filhos um mundo melhor do que aquele que encontrei.

Ser de esquerda é ter fé na espécie humana e num futuro melhor.

segunda-feira, 25 de abril de 2016

UM CONVITE À LEITURA

Os próximos passos dos golpistas são relativamente fáceis de serem traçados.

A estratégia agora será tentar a renúncia forçada da presidenta a partir da comparação massiva que a grande imprensa fará entre o seu processo de impeachment e aquele de Fernando Collor. Aqui, temos que nos atentar para três fatos relevantes: (i) Collor não sofreu impeachment, mas renunciou frente à iminente condenação. Além disso, não tinha apoio popular e via toda a classe estudantil contra si. (ii) A consistência do processo contra Collor era expressiva. Existiam provas contundentes de uso de corrupção passiva para enriquecimento pessoal. (iii) O processo contra Collor tinha requisitos legitimadores e foi conduzido de maneira legítima (o presidente da câmara não era um réu no STF, por exemplo).

Posteriormente, a principal manobra será desmontar as figuras histórica, política e feminina de Dilma.

Em relação ao primeiro, exaltarão os roubos de banco e assassinatos dos quais Dilma possivelmente foi cúmplice. Sim, foi cúmplice para que hoje a democracia pudesse existir e eu possa estar aqui escrevendo e divulgando esse texto (e você possa estar aí do outro lado lendo e discordando o quanto quiser). Contra terrorismo de estado, a solução sempre foi guerrilha.

Sobre a figura política, os mesmos (já velhos) ataques ao governo petista serão bradados, como se isso tivesse qualquer relação com o processo de impeachment. Sim, também quero muitas mudanças no governo federal, mas em 2018 e nas urnas.

Em relação à sua feminilidade, o panfleto político semanal dos economicamente privilegiados e intelectualmente defasados já nos deu pistas do que está por vir: o contraste entre a figura de Marcela Temer e Dilma. Se bela, recatada e ‘do lar’ são elogios, as palavras me faltam para me referir a alguém que, após ter sido brutalmente torturada a mando de um animal que enfiava outros animais nas vaginas de suas prisioneiras, ascendeu à presidência do Brasil por duas vezes. Ou para me referir a Amelinha Teles, que foi torturada pelo mesmo animal na frente de seus filhos de quatro e cinco anos, Edson e Janaína, e hoje integra a Comissão da Verdade de São Paulo.

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Agora, a única saída é as ruas. Primeiro de maio presenciará um grande episódio na história de nossa jovem democracia.

Se ainda tem dúvidas quanto a se juntar à defesa do estado democrático, faço um convite: leia o projeto de governo do PMDB, Uma Ponte Para o Futuro.


E não tenhamos vaidade intelectual. Mudar de opinião a qualquer altura não é sinal de incoerência e sim de caráter.

Sabe aquelas fotos nas quais você via jovens lutando contra o golpe de 64 e sentia orgulho por ter alguns deles em sua família? Sabe aquela vontade de fazer história? É chegada a hora.

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Caso queira acompanhar as próximas movimentações em favor da democracia, sugiro as duas frentes populares: POVO SEM MEDO e FRENTE BRASIL POPULAR.

https://www.facebook.com/povosemmedonacional/
https://www.facebook.com/FrenteBrasilPopular/


Procure também as frentes e movimentações de sua empresa, escola, universidade ou instituição.

sábado, 16 de abril de 2016

NADA DE NOVO NA AMÉRICA LATINA

Qual a principal motivação do processo político de impeachment em curso?

A retirada de Dilma do poder? Tornar Lula inelegível em 2018? Promover um retrocesso social no Brasil através de medidas neoliberais (privatizações, corte de programas, desregulamentações)? A mudança de rumo das investigações sobre corrupção que chegaram com toda a força em malfeitos de gestões passadas, na oposição e em quase todos os partidos?

Esses pontos são apenas coadjuvantes e, em alguns casos, consequências possíveis do processo.

A motivação central é clara: dinheiro. Ou, leia-se, o PRÉ-SAL.

Façamos um rápido exercício de ‘ligue os pontos’:

- Em 2007, o petróleo do pré-sal foi descoberto e divulgado.

- Em 2010, os vazamentos de Assange sob o nome de WikiLeaks divulgaram conversa que José Serra teve com Patrícia Padral, da Chevron, aonde disse que mudaria o esquema de exploração do petróleo para favorecer a abertura ao capital estrangeiro.

- Em 2013, Snowden divulga documentos com indícios de que a Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos (NSA) mantinha grampos ilegais em Dilma e na Petrobras. A espionagem transcorria com a colaboração dos órgãos de inteligência do Reino Unido, Canadá, Austrália e Nova Zelândia.

- Em Agosto de 2015, anuncia-se que o petróleo contido no pré-sal poderia suprir as necessidades do mundo por mais de cinco anos. Cerca de 180 bilhões de barris ou dezenas trilhões de reais.

- Em Fevereiro de 2016, a proposta de José Serra que tramitava em regime de urgência no plenário do senado revoga a participação obrigatória da Petrobras na exploração de petróleo do pré-sal.

- Após jantar com taça de vinho voando e bajulações a Temer, Serra aparece como provável integrante de um possível governo do vice-presidente.

- No documento “Uma Ponte para o Futuro” e no áudio de 15 minutos divulgado por Temer, ele sinaliza claramente aos donos do capital sua preferência por privatizações e abertura ao capital estrangeiro:

“Portanto, é fundamental realizar a inserção plena da economia brasileira no comércio internacional, com maior abertura comercial e busca de acordos regionais de comércio em todas as áreas econômicas relevantes – Estados Unidos, União Europeia e Ásia – com ou sem a companhia do Mercosul, embora preferencialmente com eles. Apoio real para que o nosso setor produtivo integre-se às cadeias globais de valor, auxiliando no aumento da produtividade e alinhando nossas normas aos novos padrões normativos que estão se formando no comércio internacional;” (extraído de UMA PONTE PARA O FUTURO)

“Nós temos absoluta convicção de que o estado depende dos setores produtivos. O estado brasileiro tem que cuidar de segurança, da saúde e da educação, mas o mais tem que ser entregue à iniciativa privada.” (transcrito do áudio divulgado por Temer)

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E assim funciona o imperialismo do século XXI, estratégia na qual os EUA estão se tornando especialistas. Ao invés de invadirem com seu exército os países que guardam recursos de seu interesse, faz-se a dominação de dentro pra fora, por meio do dinheiro, do poder e da imprensa.

Quando colocaram tanques e tropas no Iraque, causaram a comoção da opinião pública e enfraqueceram seu plano de dominação geopolítica. Ao se aliarem aos governos liberais dos países de interesse, como demonstrado pelo WikiLeaks, não se cria o mal-estar com a sociedade civil. E a mídia estará lá para justificar seus feitos.

Além disso, os golpes políticos ganham uma roupagem de legalidade. Nada foi tão revelador nos acontecimentos recentes quanto a Folha usar o termo "deposição constitucional" para se referir ao processo em andamento no Brasil. Exatamente o mesmo termo usado nos golpes em Honduras e no Paraguai.

Em 2009, Zelaya foi deposto da presidência de Honduras, ao ser arrancado à força de sua casa por militares e mandado para a Costa Rica.

Em 2012, quando o Congresso Nacional votou pelo impeachment relâmpago de Lugo em 48 horas, Franco foi colocado no poder – vice-presidente, do partido liberal, que havia rompido a coligação com Lugo um ano antes. (Lugo chegou a enfrentar 20 ameaças de impeachment ao longo de seu mandato).

A sequência lógica é simples: permite-se o financiamento empresarial de campanhas políticas. As empresas, nacionais e internacionais, investem em políticos em toda a estrutura representativa para que defendam seus interesses. Estes representantes de patrocinadores infestam o meio político. Abusando de seus poderes, defendem o interesse do dinheiro que o elegeu e não do povo (o povo apenas vota naquelas opções que chegam até si).

E como Cunha e seus mafiosos são espertos. Ao darem início a um rito de impeachment nas condições que deram, eles sabiam que os principais pontos da discussão pública recairiam sobre o PT e sobre a validade do processo de impeachment. Mas, para eles, problema nenhum. Afinal de contas, Cunha já tem mais poder do que os três poderes (já fez frente a todos) e muito mais poder do que Dilma. Assim, a discussão do impeachment poderia ocupar largo tempo de mídia, suficiente para não se abrirem discussões sobre o que previa o projeto pmdbista e seus apoiadores.

Com esse desvio de foco (reverberado por opinantes diversos nos meios de comunicação – os vendidos e os não vendidos), não se discutiu suficientemente o ponto central do golpe: a Petrobras e o pré-sal.

E, que fique claro: mesmo com os esquemas de corrupção que atuavam há cerca de 20 anos na empresa e, felizmente, estão sendo investigados, a Petrobras é o baluarte de resistência de nosso mais valioso recurso. É a pedra fundamental da soberania econômica nacional. Como escrevi, o valor estimado do pré-sal, por hora, alcança a quantia de dezenas de trilhões de reais.

A Petrobras, que quase se transformou em Petrobrax num governo recente, está na mira de uma privatização a preços módicos. Compare o preço de mercado dos recursos da Vale e o preço pelo qual ela foi vendida quando de sua privatização.

A madrugada será longa, mas a resistência será perpétua. Há que se suturar de uma vez por todas as veias ainda abertas da América Latina.

sábado, 9 de abril de 2016

A FALTA DE REFERÊNCIAS INTELECTUAIS EM TEMPOS DE REDES SOCIAIS

Não me considero especialmente inteligente. Antes de estabelecer posições e opiniões, procuro pesar argumentos e fatos de maneira demorada. Mas não somente.

Considerando-se a vasta quantidade de informações disponíveis hoje em dia na internet e a facilidade de acesso, acho essencial que se tenha algumas referências intelectuais: pessoas cujas ideias e argumentações costumam vir munidas de robustez teórica, senso crítico e inteligência.

Obviamente, não há necessidade de consonância entre ideologias – posso admirar imensamente a argumentação de alguém sem concordar com um só ponto do que disser.

E aqui entra o velho sofisma do “ouvir os dois lados” antes de se posicionar. Ponderação que se mal usada leva a discussões sobre pontos absurdos. Não é porque exista quem negue o holocausto que essa opinião deva ser levada em consideração numa discussão séria, por exemplo (sim, juro que existe gente assim).

O simples fato de alguém ter uma opinião não faz com que essa posição seja relevante.

Além disso, o fato de existirem opiniões nos extremos de um espectro não torna a questão polarizada. Como insistem em apontar sobre o atual campo de discussões políticas no Brasil (um paralogismo). No caso do processo de impeachment, por exemplo, quem cria a falsa impressão de polarização são apenas as minorias de opiniões extremadas e, principalmente, aqueles que não se posicionam em relação ao golpe. Dessa forma é mais fácil aceitar sua apatia frente a um suposto cenário polarizado, já que seu posicionamento ganha uma roupagem frágil de “aquele que não se entrega a excessos de julgamento”.

O que torna um cenário polarizado não é o número de defensores de certa posição, e sim, a relevância argumentativa de diferentes posições em relação a uma mesma questão.

Não se engane: em relação à relevância da opinião, o posicionamento ideológico do opinante pouco importa. Muito mais importante é seu histórico, seus argumentos e a relação desses com os fatos, além de sua propriedade para discutir o tema proposto.

Assim como também pouco importa o posicionamento ideológico dos veículos de comunicação (o que não é sinônimo de que não devam se posicionar). Antes disso, há seus históricos, a qualidade textual, a seriedade na apuração e divulgação dos fatos, a relevância jornalística.

O que é estranho nisso tudo é que a maior facilidade de acesso à informação parece não ter provocado um maior acesso ao conhecimento. O campo de referências se tornou muito mais difuso, dificultando um amadurecimento intelectual nesse ambiente virtual.

E como é triste constatar que parece ocorrer uma lenta substituição de referências intelectuais com o passar do tempo. Pessoas com propriedade para debater questões dentro de seus campos de domínio estão tendo seus discursos progressivamente colocados frente a frente com opiniões pouco embasadas e vindas de pessoas com preparo insuficiente.

Note, por exemplo, como a idade de opinantes de sucesso em diversos campos tem caído. Não que isso seja necessariamente um mau sinal.  O problema em si é a linha de argumentação (ou ausência desta) de discursos densamente propagados via internet, recorrentemente partindo de jovens.

Normalmente, discursos que aí se enquadram contêm um ou mais desses três pontos:

- fuga retórica (tratar o rebuscamento linguístico como sinônimo de relevância de fala, ou seja, confundir forma e conteúdo);
- questionamento das premissas básicas das questões baseado em desconhecimento histórico e de causa (“o feminismo é realmente necessário?”; “existe, de fato, racismo no Brasil?”);
- e, principalmente, argumentos que não se debruçam sobre as questões centrais do tema em pauta (“há um óbvio golpe em curso no Brasil”, “ah! Mas um partido com tantos escândalos de corrupção não pode continuar no poder”).

Algumas pessoas e meios de comunicação que estão aí enquadrados e que considero especialmente nocivos à saúde mental: Felipe Neto, Pirula, Rodrigo Constantino, Ano Zero, Brasil 247, Rafinha Bastos, Luiz Felipe Pondé, Universo Racionalista, PC Siqueira, Ricardo Noblat, Instituto von Mises, Arnaldo Jabor. Isso para não citar os caricaturais Olavo de Carvalho, Kim Kataguiri e Paul Joseph Watson.

E a gravidade da divulgação massiva de discursos desse tipo se assenta no seguinte fato: a redução do nível global de discussão. E com essa redução vem o desvio de foco.

Ao invés de se discutir maneiras de reagir frente a um dos congressos mais conservadores da nossa história, discute-se se esse mesmo congresso tem propriedade para articular um processo de impeachment.

Ao invés de se discutir formas de legalização da maconha, discute-se sua suposta nocividade e uma possível descriminalização.

Ao invés de se discutir como pressionar a gestão de Dilma para guinar à esquerda e rumo aos interesses do povo, discute-se a existência de um atentado à democracia.

Ao invés de se discutir maneiras de se ampliar a adoção de filhos por casais gays, discute-se a validade do casamento entre pessoas que se amam.

Ao invés de se discutir a desmilitarização da polícia, discute-se a validade do linchamento de cidadãos.

Os exemplos são numerosos.

Mas, por outro lado, há quem se destaque positivamente nesse cenário. E, se você chegou até aqui, deve estar curioso para saber sobre as minhas referências intelectuais. Com todo prazer. Algumas de diversos campos do conhecimento:

Noam Chomsky, Leonardo Boff, Marilena Chauí, Chico Buarque, Rodrigo Amarante, Luis Fernando Verissimo, Lúcia Fantinel, Eliane Brum, Louis CK, Marcos Bagno, João Moreira Salles, Márcia Tiburi, Glenn Greenwald, Kip Thorne, Marcelo Rubens Paiva, Vladimir Safatle, Werner Herzog, Tariq Ali, Luiz Carlos Merten.

Quais as suas?


sábado, 2 de abril de 2016

SOBRE JUVENTUDE E A DESCRENÇA POLÍTICA ou A GUERRA DE INFORMAÇÕES

Na política, nem sempre existem dois lados. Muitas vezes, existem apenas fatos e a maneira como vamos lidar com eles.
Eis alguns:
- Gilmar Mendes, quando na condição de presidente do STF, proibiu o delegado de investigar e impediu o juiz de julgar Daniel Dantas. Na época, antes mesmo de Mendes dar o segundo habeas corpus a Dantas, 45 procuradores e 130 juízes federais assinaram manifestos protestando contra as ações do presidente. Todo o caso foi fartamente documentado e exposto no livro Operação Banqueiro.
- Em 2007, neste mesmo caso, o delegado Protógenes Queiroz foi exonerado da polícia federal com a justificativa de ter cometido “infrações disciplinares”. O que ele havia feito? Entre outras coisas, instalação de grampos ilegais e vazamento ilegal de grampos autorizados.
- Este mesmo Protógenes, em 2003, deu início ao primeiro inquérito que levou à criação da CPI do Banestado, o maior escândalo (em valores) de evasão de divisas da história de nosso país.
- E quem foi um dos juízes responsáveis pelo caso Banestado, que foi engavetado à época sob pressão do governo FHC? Justamente. Sérgio Moro.
- Conforme entrevista do procurador Carlos Lima, da Lava jato, “na época, o governo Fernando Henrique Cardoso estava com o dólar em alta, assim como hoje, e existia uma pressão para abafar as investigações”.
- Em 2016, o mesmo Moro grampeou 25 advogados (o que constitui crime, já que conversas entre advogados e clientes são protegidas). Além disso, vazou ilegalmente outros tantos grampos (sim, o vazamento de grampos com participação de Dilma é ilegal).
- Dos integrantes titulares da comissão de julgamento do impeachment, um em cada três é alvo de acusações criminais no STF. E oito deles são réus.
- Lembrando que, caso o impeachment se conclua, o sucessor direto é Temer e o vice, na prática, é Cunha. Toda vez que Temer viajar, por exemplo, quem assume é Cunha. Em relação a estes dois, acho que não preciso argumentar sobre seus históricos.
- Para se haver impeachment nos moldes legais é necessário que haja crime de responsabilidade. A lei do impeachment, ou lei dos crimes de responsabilidade, não tipifica como crime de responsabilidade a violação da lei de responsabilidade fiscal.
- As tais pedaladas podem ser consideradas, no máximo, violação da lei de responsabilidade fiscal, mas não crime de responsabilidade. E, ainda que fossem (não são), é bom lembrar que outros 16 governadores fizeram o mesmo. Assim como Lula e FHC. Não me lembro de terem julgado os ex-presidentes por isso ou estarem pretendendo julgar também os governadores em exercício.
Posto isso tudo, estão devidamente apresentados os principais articulistas e defensores do impeachment. Tenho numerosas críticas às gestões de Dilma e ao comportamento do PT no poder. Mas a questão, no momento, se resume a: devemos nos opor a um processo de impeachment articulado por estas pessoas e nesses termos?
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O que nos traz ao posicionamento da juventude.
As palavras de ordem, em meio à parcela significativa dos jovens, são ''apartidarismo'' e ‘’imparcialidade’’. Há uma noção errônea de que caso você saia em defesa de um lado, um partido, uma causa, você tem, automaticamente, seu senso de julgamento afetado. Estima-se que o outro, ao escolher um lado, prontamente passará a defender aquele lado de forma irracional, numa constante subestimação da inteligência alheia.
Quando, na verdade, o saudável é que ocorra justamente o contrário. Numa democracia, ao pesar fatos e opiniões, é necessário, seminal, crucial que você se posicione. Principalmente em conjunturas especialmente dicotômicas, como no segundo turno das eleições ou no atual momento (a favor ou contra o impeachment), se omitir e ficar em cima do muro é postergar a dor do tombo que virá com sua iminente queda. E só a História, então, lembrará de seus lados e quem estava aonde.
Ontem, na manifestação CANTO PELA DEMOCRACIA, um conjunto de artistas se apresentou na Praça da Estação em Belo Horizonte em prol da democracia.
Mas o que mais chamou a atenção foi a quase ausência da parcela jovem da população. Nos olhos daqueles senhores e senhoras presentes era possível ler o descontentamento com a necessidade de voltarem às ruas para lutar pela democracia frente à apatia da juventude. Entre estes, era possível reconhecer educadores e educadoras, professores e professoras, acadêmicos diversos e certo desânimo.
Incomoda muito a ideia de que as instituições estão se posicionando (SBPC, ADUSP, UNICAMP, Faculdade de Direito da UFMG, ONU Mulheres), os artistas estão se posicionando (Chico Buarque, Wagner Moura, Letícia Sabatella, Caetano, Criolo, Emicida, Muylaert), a mídia internacional está se posicionando (Publico, Der Spiegel, El País, Al Jazeera, The Intercept), mas a principal força política do país, a juventude munida de informação, está inercial.
A História vai cobrar caro por esse negacionismo. A guerra que se trava, mais do que nunca, é de informação.
Mesmo que não passe o golpe de estado, o maior golpe é o estado da nossa juventude.
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Por Fábio Domeniconi, em 01/04/2016.

O maior amor do mundo

Foi dar a chance e descobri não só o amor, mas o maior amor do mundo. Contido em uma menina de pequeno porte, alcança espíritos que se escondem atrás de serras. Alcança ouvidos nunca antes usados. Alcança olhos que se quedan eternamente gratos. Ela e ele elevaram a expressão melhores amigos a outro nivel, cumplicidade tátil. Restauram a fé na espécie quando em meio a esse caos de gente. Privilégio ela me dar um pedacinho de seu mundo e proporcionar a felicidade a alguém que nunca esteve tão confortável nos bastidores do espetáculo. O protagonismo me é menor, e aqui me cuido e descuido. Ao vê-la ao meu lado pela manhã recai sobre o quarto a certeza de não precisar mais de nada. Sou pleno. A sombra que tua fronde projeta sobre mim é a mais doce que já tive a chance de me postar. Nela quero ficar até o sol cair.

SOBRE DIAS SOMBRIOS

- Uma carta “vazada”, endereçada para o Presidente, tenta desestabilizar o governo. (1)
- Tenta-se, de toda forma, convencer de que o governo de situação é o mais corrupto de toda a história. (2)
- Critica-se ferrenhamente as relações entre governos latino-americanos e tentam associar o Presidente aos governos de outros países em crise. (3)
- Parcela bem peculiar da população sai às ruas em várias manifestações demonizando o governo de situação e, em meio a essas, alguns pedem intervenção militar.
- Na falta de delitos graves, um ex-presidente é acusado de ser dono de imóvel em nome de amigo. (4)
- Um ex-governador, bon vivant no Rio de Janeiro e muito influente nos meios de comunicação, que se apresenta como principal opção em relação ao governo de situação, espera que a queda do Presidente jogue a presidência em seu colo. Tal político tem ligações familiares com figura política conhecida. (5)
- Cerca de 500 mil pessoas saem em uma manifestação em março, com participantes que vão de extremistas a desiludidos com a política, além dos macartistas de costume. Boa parte dos carros, faixas e custos da manifestação é bancada pela elite econômica (que tem braços internacionais). Claro, as cores do Brasil se espalham, de camisas a faixas e bandeiras. (6)
- Em meio a uma crise econômica, sem conseguir agradar a seus apoiadores de costume e sofrendo oposição massiva, o governo se vê sem saída.
Achou familiar? Reconheceu algo? Deveria mesmo. Aconteceu tudo no seu país, em momentos que antecederam o golpe de 64.

*Referências:

(1) Plano Cohen, Getúlio.
(2) JK e Jango.
(3) Carta Brandi, Jango e o governo argentino.
(4) JK e o imóvel na Vieira Souto.
(5) Carlos Lacerda, tio-avô de Márcio Lacerda (prefeito de Belo Horizonte).
(6) Marcha da família, com Deus, pela liberdade.

Release: PEARL JAM – Belo Horizonte 20/11/2015

Lá pelos idos de 2000, quando tinha uns nove anos, lembro-me de ter escutado o timbre de uma voz memorável: meu irmão, Di, estava escutando Live on Two Legs num volume intenso em nosso quarto. Era meu primeiro contato com o Pearl Jam (do qual me recordo).
Quinze anos passados, a banda finalmente aportou em território mineiro. E não pude deixar de experimentar uma sensação semelhante àquele momento quando Ed falou em seu português minguado: “Vamos começar dizendo algo que nunca dissemos antes: E aí Belo Horizonte?”.
Bandeiras de Minas foram agitadas com empolgação e veio uma sequência destruidora: Small Town, Go, Mind Your Manners e Once. Nessa última, a empolgação contagiou Ed que, a certa altura, lançou o microfone para os fãs na pista cantarem. Got Some e Rearviewmirror ainda completaram a sequência de abertura fazendo o público delirar.
Given to Fly trouxe consigo belíssimas imagens aéreas de Belo Horizonte captadas por um drone, num momento no qual o setlist foi invadido por músicas menos conhecidas do grande público, como Pilate, Infallible, I’m Open e Satan’s Bed.
Por mais de uma vez, Ed falou a respeito da catástrofe em Mariana, lamentando o fato de que, mesmo após o ocorrido, as empresas continuarão a lucrar. Disse, ainda, que os cachês do show seriam doados às vítimas atingidas. Trata-se de mais um gesto humano de uma banda com longo histórico de engajamento político, ambiental e, principalmente, social.
O Pearl Jam sustenta a Vitalogy Foundation, instituição muito ativa em diversos campos, além de se envolver com campanhas sociais (pro-choice, pro-vote) e anti-belicistas (contra a guerra do Iraque). Fora isto, ainda foram alguns dos artistas que fizeram ostensiva campanha a favor de Obama e contra Bush filho (Bu$hleaguer, World Wide Suicide), demonstrando que entendem a importância de artistas se posicionarem politicamente.
No primeiro bis, um set acústico com uma ótima sequência: Bee Girl, Sleeping by Myself, Imagine e Sirens, acompanhadas pelas vozes do público em altíssimo volume. Seguiu-se uma homenagem à tragédia francesa com um cover de Eagles of Death Metal - I Want You So Hard e, depois, Do the Evolution. Entre Corduroy e Porch, ainda houve tempo para uma surpresa curiosa: Stone cantando Mankind, algo raro de se presenciar.
Garden e Confortably Numb abriram o último terço do show, seguidas dos usuais hits de despedida. Ed ainda se referiu à capital como ‘BH’, numa intimidade que construíra com o público ao longo do show, comentando o lindo fato de ter jovens crianças nos ombros de seus pais ainda nas primeiras filas da pista.
A insana lógica de lucro capitalista foi comentada novamente por Ed, lembrando que o desenvolvimento usado como justificativa parece alcançar pequena parcela da população, enquanto os danos chegam a todos. A mesma lógica que não permitiu meu irmão estar no show comigo ou destruiu a vida de milhares de pessoas de Minas Gerais.
E ainda destruirá outras tantas.