Na política, nem sempre existem dois lados. Muitas vezes, existem apenas fatos e a maneira como vamos lidar com eles.
Eis alguns:
- Gilmar Mendes, quando na condição de presidente do STF, proibiu o delegado de investigar e impediu o juiz de julgar Daniel Dantas. Na época, antes mesmo de Mendes dar o segundo habeas corpus a Dantas, 45 procuradores e 130 juízes federais assinaram manifestos protestando contra as ações do presidente. Todo o caso foi fartamente documentado e exposto no livro Operação Banqueiro.
- Em 2007, neste mesmo caso, o delegado Protógenes Queiroz foi exonerado da polícia federal com a justificativa de ter cometido “infrações disciplinares”. O que ele havia feito? Entre outras coisas, instalação de grampos ilegais e vazamento ilegal de grampos autorizados.
- Este mesmo Protógenes, em 2003, deu início ao primeiro inquérito que levou à criação da CPI do Banestado, o maior escândalo (em valores) de evasão de divisas da história de nosso país.
- E quem foi um dos juízes responsáveis pelo caso Banestado, que foi engavetado à época sob pressão do governo FHC? Justamente. Sérgio Moro.
- Conforme entrevista do procurador Carlos Lima, da Lava jato, “na época, o governo Fernando Henrique Cardoso estava com o dólar em alta, assim como hoje, e existia uma pressão para abafar as investigações”.
- Em 2016, o mesmo Moro grampeou 25 advogados (o que constitui crime, já que conversas entre advogados e clientes são protegidas). Além disso, vazou ilegalmente outros tantos grampos (sim, o vazamento de grampos com participação de Dilma é ilegal).
- Dos integrantes titulares da comissão de julgamento do impeachment, um em cada três é alvo de acusações criminais no STF. E oito deles são réus.
- Lembrando que, caso o impeachment se conclua, o sucessor direto é Temer e o vice, na prática, é Cunha. Toda vez que Temer viajar, por exemplo, quem assume é Cunha. Em relação a estes dois, acho que não preciso argumentar sobre seus históricos.
- Para se haver impeachment nos moldes legais é necessário que haja crime de responsabilidade. A lei do impeachment, ou lei dos crimes de responsabilidade, não tipifica como crime de responsabilidade a violação da lei de responsabilidade fiscal.
- As tais pedaladas podem ser consideradas, no máximo, violação da lei de responsabilidade fiscal, mas não crime de responsabilidade. E, ainda que fossem (não são), é bom lembrar que outros 16 governadores fizeram o mesmo. Assim como Lula e FHC. Não me lembro de terem julgado os ex-presidentes por isso ou estarem pretendendo julgar também os governadores em exercício.
Posto isso tudo, estão devidamente apresentados os principais articulistas e defensores do impeachment. Tenho numerosas críticas às gestões de Dilma e ao comportamento do PT no poder. Mas a questão, no momento, se resume a: devemos nos opor a um processo de impeachment articulado por estas pessoas e nesses termos?
_________
O que nos traz ao posicionamento da juventude.
As palavras de ordem, em meio à parcela significativa dos jovens, são ''apartidarismo'' e ‘’imparcialidade’’. Há uma noção errônea de que caso você saia em defesa de um lado, um partido, uma causa, você tem, automaticamente, seu senso de julgamento afetado. Estima-se que o outro, ao escolher um lado, prontamente passará a defender aquele lado de forma irracional, numa constante subestimação da inteligência alheia.
Quando, na verdade, o saudável é que ocorra justamente o contrário. Numa democracia, ao pesar fatos e opiniões, é necessário, seminal, crucial que você se posicione. Principalmente em conjunturas especialmente dicotômicas, como no segundo turno das eleições ou no atual momento (a favor ou contra o impeachment), se omitir e ficar em cima do muro é postergar a dor do tombo que virá com sua iminente queda. E só a História, então, lembrará de seus lados e quem estava aonde.
Ontem, na manifestação CANTO PELA DEMOCRACIA, um conjunto de artistas se apresentou na Praça da Estação em Belo Horizonte em prol da democracia.
Mas o que mais chamou a atenção foi a quase ausência da parcela jovem da população. Nos olhos daqueles senhores e senhoras presentes era possível ler o descontentamento com a necessidade de voltarem às ruas para lutar pela democracia frente à apatia da juventude. Entre estes, era possível reconhecer educadores e educadoras, professores e professoras, acadêmicos diversos e certo desânimo.
Incomoda muito a ideia de que as instituições estão se posicionando (SBPC, ADUSP, UNICAMP, Faculdade de Direito da UFMG, ONU Mulheres), os artistas estão se posicionando (Chico Buarque, Wagner Moura, Letícia Sabatella, Caetano, Criolo, Emicida, Muylaert), a mídia internacional está se posicionando (Publico, Der Spiegel, El País, Al Jazeera, The Intercept), mas a principal força política do país, a juventude munida de informação, está inercial.
A História vai cobrar caro por esse negacionismo. A guerra que se trava, mais do que nunca, é de informação.
Mesmo que não passe o golpe de estado, o maior golpe é o estado da nossa juventude.
____
Por Fábio Domeniconi, em 01/04/2016.
Nenhum comentário:
Postar um comentário