Não me considero especialmente inteligente. Antes de
estabelecer posições e opiniões, procuro pesar argumentos e fatos de maneira
demorada. Mas não somente.
Considerando-se a vasta quantidade de informações
disponíveis hoje em dia na internet e a facilidade de acesso, acho essencial
que se tenha algumas referências intelectuais: pessoas cujas ideias e
argumentações costumam vir munidas de robustez
teórica, senso crítico e inteligência.
Obviamente, não há necessidade de consonância entre
ideologias – posso admirar imensamente a argumentação de alguém sem concordar
com um só ponto do que disser.
E aqui entra o velho sofisma do “ouvir os dois lados” antes
de se posicionar. Ponderação que se mal usada leva a discussões sobre pontos
absurdos. Não é porque exista quem negue o holocausto que essa opinião deva ser
levada em consideração numa discussão séria, por exemplo (sim, juro que existe
gente assim).
O simples fato de alguém ter uma opinião não faz com que
essa posição seja relevante.
Além disso, o fato de existirem opiniões nos extremos de um
espectro não torna a questão polarizada. Como insistem em apontar sobre o atual
campo de discussões políticas no Brasil (um paralogismo). No caso do processo
de impeachment, por exemplo, quem cria a falsa impressão de polarização são
apenas as minorias de opiniões extremadas e, principalmente, aqueles que não se
posicionam em relação ao golpe. Dessa forma é mais fácil aceitar sua apatia
frente a um suposto cenário polarizado, já que seu posicionamento ganha uma
roupagem frágil de “aquele que não se entrega a excessos de julgamento”.
O que torna um cenário polarizado não é o número de
defensores de certa posição, e sim, a relevância argumentativa de diferentes
posições em relação a uma mesma questão.
Não se engane: em relação à relevância da opinião, o
posicionamento ideológico do opinante pouco importa. Muito mais importante é
seu histórico, seus argumentos e a relação desses com os fatos, além de sua
propriedade para discutir o tema proposto.
Assim como também pouco importa o posicionamento ideológico
dos veículos de comunicação (o que não é sinônimo de que não devam se
posicionar). Antes disso, há seus históricos, a qualidade textual, a seriedade
na apuração e divulgação dos fatos, a relevância jornalística.
O que é estranho nisso tudo é que a maior facilidade de
acesso à informação parece não ter provocado um maior acesso ao conhecimento. O
campo de referências se tornou muito mais difuso, dificultando um amadurecimento
intelectual nesse ambiente virtual.
E como é triste constatar que parece ocorrer uma lenta
substituição de referências intelectuais com o passar do tempo. Pessoas com
propriedade para debater questões dentro de seus campos de domínio estão tendo
seus discursos progressivamente colocados frente a frente com opiniões pouco
embasadas e vindas de pessoas com preparo insuficiente.
Note, por exemplo, como a idade de opinantes de sucesso em diversos
campos tem caído. Não que isso seja necessariamente um mau sinal. O problema em si é a linha de argumentação
(ou ausência desta) de discursos densamente propagados via internet,
recorrentemente partindo de jovens.
Normalmente, discursos que aí se enquadram contêm um ou mais
desses três pontos:
- fuga retórica (tratar o rebuscamento linguístico como
sinônimo de relevância de fala, ou seja, confundir forma e conteúdo);
- questionamento das premissas básicas das questões baseado
em desconhecimento histórico e de causa (“o feminismo é realmente necessário?”;
“existe, de fato, racismo no Brasil?”);
- e, principalmente, argumentos que não se debruçam sobre as
questões centrais do tema em pauta (“há um óbvio golpe em curso no Brasil”, “ah!
Mas um partido com tantos escândalos de corrupção não pode continuar no
poder”).
Algumas pessoas e meios de comunicação que estão aí enquadrados
e que considero especialmente nocivos à saúde mental: Felipe Neto, Pirula,
Rodrigo Constantino, Ano Zero, Brasil 247, Rafinha Bastos, Luiz Felipe Pondé, Universo
Racionalista, PC Siqueira, Ricardo Noblat, Instituto von Mises, Arnaldo Jabor.
Isso para não citar os caricaturais Olavo de Carvalho, Kim Kataguiri e Paul
Joseph Watson.
E a gravidade da divulgação massiva de discursos desse tipo
se assenta no seguinte fato: a redução do nível global de discussão. E com essa
redução vem o desvio de foco.
Ao invés de se discutir maneiras de reagir frente a um dos
congressos mais conservadores da nossa história, discute-se se esse mesmo
congresso tem propriedade para articular um processo de impeachment.
Ao invés de se discutir formas de legalização da maconha,
discute-se sua suposta nocividade e uma possível descriminalização.
Ao invés de se discutir como pressionar a gestão de Dilma
para guinar à esquerda e rumo aos interesses do povo, discute-se a existência
de um atentado à democracia.
Ao invés de se discutir maneiras de se ampliar a adoção de
filhos por casais gays, discute-se a validade do casamento entre pessoas que se
amam.
Ao invés de se discutir a desmilitarização da polícia,
discute-se a validade do linchamento de cidadãos.
Os exemplos são numerosos.
Mas, por outro lado, há quem se destaque positivamente nesse
cenário. E, se você chegou até aqui, deve estar curioso para saber sobre as
minhas referências intelectuais. Com todo prazer. Algumas de diversos campos do
conhecimento:
Noam Chomsky, Leonardo Boff, Marilena Chauí, Chico Buarque,
Rodrigo Amarante, Luis Fernando Verissimo, Lúcia Fantinel, Eliane Brum, Louis
CK, Marcos Bagno, João Moreira Salles, Márcia Tiburi, Glenn Greenwald, Kip
Thorne, Marcelo Rubens Paiva, Vladimir Safatle, Werner Herzog, Tariq Ali, Luiz
Carlos Merten.
Quais as suas?
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