segunda-feira, 3 de outubro de 2016

NOTAS SOBRE O GOLPE E O MAR DE CONSERVADORISMO

"O verdadeiro problema é que o PMDB não tem estrutura ideológica ou política que possa formular e implementar uma agenda política nacional coerente. Apesar da ilustre história do partido cuja força motriz levou o Brasil da ditadura militar para a democracia, o PMDB, que agora detém o equilíbrio do poder político, foi transformado numa coalizão de oportunistas “caciques” regionais que em sua maior parte - e não são exceções - buscam o poder político para o seu próprio bem. Um partido tal não é adequado para a tarefa de fornecer uma orientação política." - apontamentos da Embaixada Norte-Americana, extraídos de documentos vazados pelo WikiLeaks, numa reunião em 2006 na qual Michel Temer era informante dos norte-americanos. (https://wikileaks.org/plusd/cables/06SAOPAULO30_a.html…)
Lembrando que a embaixadora dos EUA no Brasil desde agosto de 2013, Liliana Ayalde, serviu como embaixadora no Paraguai de 2008 a 2011 e transferiu seu cargo para James Thessin meses antes do golpe que destituiu o presidente Fernando Lugo em 22 de junho de 2012.
Nada de novo quando se fala do país que, comprovadamente, teve participação no golpe de 64 no Brasil, como fartamente documentado e exposto no documentário O Dia que Durou 21 Anos.
O que nos traz ao atual interesse americano em terras tupiniquins: implantação do neoliberalismo (ou venda do estado ao capital privado).
A agenda neoliberal (privatizações, desregulamentações e cortes em programas sociais) criada nos porões de Chicago sempre precisa do caos político-econômico para ser instaurada. Foi assim no golpe de Pinochet no Chile, foi assim na década de 90 na América Latina e está sendo assim no golpe de estado em curso no Brasil.
E quem poderá ser o veículo nacional de implantação da agenda? Bem, os Estados Unidos, declaradamente, não confiam muito nos caciques do PMDB. Lembremos então de quem arcou com os R$ 45 mil pagos pela peça de acusação do golpe como registrado em vídeo e de quem insistiu na tese de “conjunto da obra” durante a encenação do processo.
Além disso, Gilmar Mendes disse recentemente que ‘’está ficando cada vez mais difícil’’ votar os quatro procedimentos da ação que o PSDB move contra a chapa Dilma-Temer até o fim de 2016. O que faria com que, durante dois anos, Temer pudesse ser cassado e uma eleição indireta viria logo em sequência.
Enquanto isso, a junta de golpe que assaltou o poder executivo nacional decretou aumento de 50% nos gastos em publicidade estatal. Mais 24,4% na Globo, mais 78% na Folha/UOL, mais 624% na Abril e mais 1129% na Band. Eles querem com recibo e juros.
Assim sendo, com a mídia vendida e fortalecida, e as esquerdas à míngua, as eleições presidenciais antecipadas com aval popular não seriam uma ótima maneira de legitimar o golpe?
O empenho na luta e o crescimento das mobilizações quando do aparecimento da pauta “Diretas Já” demonstra que não foi só a direita que não aceitou os resultados das urnas em 2014.
Entre os devaneios do ''Diretas Já'' e ''Anula, STF'', fico com o segundo. Somente ele conservaria o quase nada que resta de democracia. Afinal, antecipar eleições por meio de golpe parlamentar é golpe.
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O conservadorismo está em franca expansão no Brasil.
A vereadora mais votada do Recife critica mulheres que deixam de ser submissas aos seus maridos: ''o homem está, sim, acima da mulher".
Um pastor da Igreja Universal foi o vereador mais votado de Manaus e Carlos Bolsonaro foi o mais votado no Rio de Janeiro.
Na Bahia, um pastor sargento, durante os debates para a eleição à prefeitura, sacou uma bíblia para fazer a réplica à uma candidata do PCdoB.
Citado pelo vice-presidente do próprio PSDB como "uma farsa em todos os sentidos" e "totalmente desprovido de escrúpulos", o novo prefeito de São Paulo apontou: “namorado educado não divide conta com namorada. E muito menos deixa ela pagar. Se não tiver dinheiro, faça um programa mais simples”.
Se o voto anulado por togados e parlamentares representa a falência democrática, o voto anulado voluntariamente é um insulto à memória daqueles que lutaram contra a ditadura e pelo direito de votar.
Com a esquerda representando, historicamente, minorias políticas e grupos de resistência, o desencanto popular com a política sempre vai fortalecer a direita conservadora. Vender soluções é sua especialidade.
Não há como, de fato, se abster na democracia representativa – ao não escolher um lado, você está escolhendo o lado do oportunismo imediato. E, desse oportunismo, o conservadorismo sabe se aproveitar como ninguém.